Dólar a R$ 6,30: Entenda o que está por trás dessa alta

Dólar a R$ 6,30: Entenda o que está por trás dessa alta
Brasil de Fato

A vida para o brasileiro nunca foi fácil e, como se não bastasse, perto das festas de fim de ano acontece um caos no país que faz com que o dólar chegue a R$ 6,30. Mas, se você quiser enxergar esse câmbio por outro ângulo, o real vale apenas US$ 0,16.

Daí você pode dizer que é o dólar que está subindo como resultado de uma economia um pouco mais forte nos Estados Unidos e o otimismo em relação ao presidente eleito Donald Trump. Na verdade, não.

Embora haja, sim, um otimismo em relação aos EUA, a questão é que o real foi um péssimo dinheiro para manter seu patrimônio este ano. O dinheiro de papel do Brasil está liderando o ranking de desvalorização frente ao dólar.

Para você ter uma ideia, em 1º de janeiro de 2024, um dólar valia R$ 4,85. No momento da escrita da matéria, a moeda dos EUA já é cotada a R$ 6,31. Ou seja, uma alta de 30%. A situação fica ainda pior quando você descobre que apenas quatro outras moedas desvalorizaram em dois dígitos contra o dólar este ano:

  • Peso mexicano (16%)
  • Lira turca (16%)
  • Rublo russo (15%)
  • Won sul-coreano (10%)

E essa alta, que nos deixa com uma distância longa do segundo colocado, chegou após muita luta do Banco Central. Afinal, desde a última semana, a autoridade monetária já vendeu mais de 12,7 bilhões de dólares em operações à vista e compromissos de recompra.

Para André Galhardo, consultor econômico da Remessa Online, o timing das intervenções do BC foi inadequado. Ele destacou que a atuação esporádica do banco em momentos críticos pode ser interpretada como um sinal de deterioração adicional.

Segundo Galhardo, a falta de ações consistentes ao longo do ano gerou uma corrida por dólares, agravando o desequilíbrio cambial.

Mas o que está fazendo o dólar subir tanto assim no Brasil?

Incertezas sobre o andamento das medidas fiscais e o impacto de decisões do mercado internacional. Mesmo com a aprovação do texto-base de um dos projetos do pacote fiscal na Câmara dos Deputados, o mercado cambial não reagiu com otimismo.

Na terça-feira, o Congresso aprovou o texto-base do Projeto de Lei Complementar 210, que prevê controles sobre o crescimento de despesas com pessoal e incentivos tributários em cenários de déficit fiscal.

No entanto, a aprovação dos demais projetos que compõem o pacote está sendo acompanhada com cautela pelos investidores, pois o recesso parlamentar se aproxima e há dúvidas sobre a eficácia do conjunto de medidas.

De acordo com Matheus Spiess, da Empiricus Research, o pacote fiscal atual apresenta limitações e pode não ser suficiente para reconquistar a confiança do mercado.

Spiess apontou que o impacto total das medidas só será percebido quando o Congresso concluir a análise de todas as propostas ainda nesta semana.

O impacto do Federal Reserve

A pressão sobre o real também foi impulsionada pela decisão do Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, que anunciou uma nova redução em sua taxa de juros principal, de 0,25 ponto percentual, agora variando entre 4,25% e 4,50% ao ano.

Com isso, na última quarta-feira (18), a valorização da moeda norte-americana atingiu 2,36%, sendo negociada a R$ 6,240 por volta das 16h10. Já o dólar turismo alcançou R$ 6,465, com alta de 2,10%.

Além disso, a movimentação cambial pressionou ainda mais o mercado brasileiro, fazendo com que o Ibovespa recuasse 2,38%, atingindo 121.730 pontos.

Uma curiosidade é que, embora o valor nominal de R$ 6,30 seja o mais alto já registrado, a maior cotação real — ajustada pela inflação — foi alcançada em setembro de 2002, durante o primeiro ciclo eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva. Naquela ocasião, o valor corrigido chegaria hoje a R$ 8,75.

Ataque especulativo?

De acordo com Luciana Acioly, doutora em economia e presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal, o atual cenário favorece operações especulativas.

“Momentos de incerteza são propícios para estratégias de curto prazo. O dólar, nesse contexto, é a alternativa mais utilizada”.

Ela destaca ainda que o comportamento de grandes investidores acaba incentivando um “efeito manada”, no qual outros agentes do mercado replicam essas movimentações.

Contas públicas

Conforme observado pela Agência Brasil, Adalmir Marquetti, professor de Economia da PUC do Rio Grande do Sul, avalia que as dificuldades enfrentadas pelo governo para comunicar e implementar medidas fiscais têm contribuído para o ambiente de instabilidade.

“A mistura de mudanças no imposto de renda com os cortes de gastos em um único pacote criou ruídos desnecessários. Porém, o avanço das propostas no Congresso pode ajudar a acalmar o mercado”.

Outro ponto que merece atenção, segundo o economista José Luiz Oreiro, da Universidade de Brasília, é a possibilidade de envio irrestrito de recursos ao exterior, algo permitido por uma lei aprovada em 2021.

“Essa mudança legislativa abriu espaço para que residentes do Brasil remetam todo o seu capital financeiro para fora. Isso fragiliza ainda mais nossas reservas internacionais”.

Fake news

De acordo com o G1, a Advocacia-Geral da União (AGU) acionou a Polícia Federal para investigar uma publicação em redes sociais que atribuiu declarações fictícias ao próximo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.

A AGU apontou que a notícia falsa afetou diretamente os esforços do governo para estabilizar o preço do dólar.

A postagem atribuía a Galípolo a defesa da adoção de uma moeda dos Brics como alternativa ao dólar, além de prever que a moeda norte-americana voltaria ao patamar de R$ 5.

Em nota, a AGU destacou que boatos como esse comprometem a eficácia de políticas públicas voltadas à estabilização cambial e têm potencial para gerar prejuízos graves.

“A desinformação, ao interferir diretamente na percepção do mercado, comprometeu a eficácia da política pública federal de estabilização cambial”.

Além de acionar a Polícia Federal, a AGU pediu que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) investigue as postagens falsas, pois a oscilação no valor do dólar afeta diretamente os preços de ativos negociados nas bolsas de valores.

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