Michela Galvão comenta: O preconceito oculto no mercado de criptomoedas

Michela Galvão comenta: O preconceito oculto no mercado de criptomoedas

Sem dúvida, o mercado de criptomoedas é um dos mais acessíveis para perfis diversos de pessoas. Essa acessibilidade está muito ligada à tecnologia blockchain que, diferentemente de bancos e demais instituições financeiras, não se importa com quem a utiliza, possibilitando que o mundo das finanças chegue a praticamente todos os cantos do planeta.

No entanto, a acessibilidade da indústria cripto dura apenas até a página dois. Afinal, quando o ser humano está envolvido, muitas vezes, o lado perverso de todo tipo de preconceito se manifesta. Não foi à toa que, ao criar o Bitcoin, Satoshi Nakamoto retirou a necessidade de confiar nas pessoas para o funcionamento da criptomoeda, voltando nossa confiança para a tecnologia.

Só que de nada adianta apenas olharmos para o desenvolvimento da tecnologia se, no fim das contas, ela depende do ser humano para evoluir. Dessa forma, a raiz do problema precisa ser arrancada, mesmo com o mercado de criptomoedas sendo majoritariamente composto por conservadores que se revoltam a cada fala de uma minoria.

Quem entende bem que precisamos fazer uma revolução neste mercado é Michela Galvão, especialista em DeFi e empreendedora social, e Vanessa Oliveira, fundadora da ZeroUmCripto e CTO do Blackchain.news.

Estamos aqui para servir?

Ao falar sobre racismo no mercado de criptomoedas, Vanessa relatou uma experiência em que foi confundida com uma funcionária da limpeza durante um evento cripto. Mesmo vestida de forma social e sendo palestrante especializada em criptoativos e investimentos, o preconceito racial se manifestou de forma direta.

“Por que ele não perguntou para outra pessoa e perguntou exatamente para mim?”

Conforme observado por Michela, infelizmente essa é uma realidade que pessoas negras acabam vivendo, não apenas no mercado cripto, mas na vida.

A especialista em DeFi ainda destacou que, mesmo com o conhecimento profundo sobre o setor blockchain, ela e outras profissionais negras veem pessoas com menos preparo assumindo espaços de destaque simplesmente por causa de sua aparência.

A apropriação do conhecimento gerado por outros e a falta de reconhecimento de suas contribuições são outras barreiras apontadas por Michela.

Além disso, a empreendedora enfatiza que a indústria cripto pode ser uma ferramenta de transformação. Contudo, ela aponta para o fato de que as elites que já controlam o mercado financeiro tradicional também estão se apropriando do Bitcoin e das inovações da blockchain, limitando o potencial revolucionário do setor.

“O mercado cripto, eu falo que é uma excelente oportunidade para a gente mudar o estado das coisas. A gente pode mudar esse sistema completamente. Só que as pessoas que têm o poder de mudar, elas não querem perder seus privilégios, nunca quiseram e não vai ser agora”.

Isso me lembra o boom das memecoins e dos NFTs

Durante o boom das memecoins no primeiro semestre de 2024, desenvolvedores não se limitaram a criar altcoins divertidas com temas de gatos e cachorros, mas foram além, criando TOKENS COM INSULTOS RACISTAS E HOMOFÓBICOS. Como se não bastasse, investidores fizeram com que tokens dessa temática atingissem a casa dos bilhões de dólares.

É preciso dizer que essas memecoins não se popularizaram sem críticas de nomes como Vitalik Buterin, frequentemente julgado por sua defesa de grupos minoritários, e Austin Federa, da Solana Foundation, que destacou que os desenvolvedores deveriam incluir nas carteiras a opção de uma lista de bloqueios para que os investidores possam filtrar certos tipos de tokens.

Por outro lado, ao falar com o Cointelegraph, o chefe de dados da Nansen, Martin Lee, disse que “as tendências das memecoins são uma função do mercado de criptomoedas, que é o mais aberto e livre que existe no mundo. A capacidade de criar um token e os traders poderem negociar ativamente esses ativos são todos habilitados pelos benefícios das criptomoedas. ELES NÃO SÃO INERENTEMENTE BONS OU RUINS”.

Voltando um pouco para 2022, um projeto de NFTs lançado nos Estados Unidos teve uma equipe que não se preocupou nem um pouco em divulgar conteúdo altamente ofensivo e racista.

Batizado inicialmente de MetaSlave, ou “MetaEscravo” em tradução livre, o projeto colocou à venda imagens de pessoas negras, criando uma analogia explícita aos leilões de escravos.

A proposta original incluía a criação de 1865 NFTs, número que faz referência ao ano da abolição da escravidão nos Estados Unidos. No entanto, a ideia de comercializar imagens de pessoas negras sob o título de “escravos digitais” logicamente não foi bem recebida.

E se você acha que não poderia piorar, a primeira peça da coleção foi uma imagem de George Floyd, homem negro cuja morte em 2020, nas mãos de policiais em Minneapolis, gerou um movimento global contra o racismo. O token foi nomeado como “MetaSlave #1 – I CAN’T BREATHE”, em referência às últimas palavras de Floyd.

A reação nas redes foi imediata, com acusações de racismo e exploração, sendo a coleção acusada de insensível e de perpetuar estereótipos raciais.

Os responsáveis pelo projeto tentaram amenizar a situação alterando o nome da coleção para MetaHumans e incluindo imagens de pessoas de diferentes etnias. Em um tweet, eles também se desculparam com a famosa frase “a quem se sentiu ofendido”.

A justificativa dada pelos responsáveis – de que o projeto buscava “homenagear” o fim da escravidão – não convenceu. Afinal, conforme observado por Michela:

“A gente sente isso na nossa pele 24 horas, todo santo dia, num momento de trabalho, num momento de lazer. Então, não venha dizer que quando a gente fala que as coisas para a gente são dez casas abaixo e que a nossa escada tem um milhão de degraus a mais do que para outra galera, isso é vitimismo ou mimimi. Isso é a nossa realidade e a dor de quem sente”.

Veja o bate-papo completo de Vanessa e Michela:

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