O fenômeno morango do amor transformou confeitarias de todo o país em minas de ouro instantâneas. Em São Paulo, uma pequena doceria esgotou 100 unidades por dia a R$ 16,90 cada, rendendo R$ 1.600 diários somente com o novo doce.
No extremo oposto do mapa, em Boa Vista (Roraima), uma jovem confeiteira vendeu 2 mil unidades em apenas dois dias, faturando R$ 34 mil no período.
Até no exterior a febre se alastra. Uma cafeteria brasileira em Nova York despacha 270 morangos por dia a US$ 7,99 (R$ 44) cada, alcançando quase R$ 50 mil por semana só com essa sobremesa “instagramável”.
Diante desses números, uma confeiteira paulistana resumiu bem a situação: “É uma loucura, parece Páscoa” – um faturamento sazonal digno de feriado prolongado, em pleno meio do ano.
A febre é tanta que até as grandes redes entraram no jogo. A franquia Sodiê Doces (com 400 lojas no Brasil) lançou seu próprio morango do amor e vendeu 8 mil unidades no primeiro dia em escala nacional.
Confeiteiras independentes reportam ganhos entre R$ 20 mil e R$ 70 mil em uma única semana graças à moda.
Ou seja, um simples morango açucarado está proporcionando em dias o que muitos negócios levam meses para faturar.
E quanto custa produzir essa maravilha?
Para produzir 10 unidades, os custos estimados são:
- Morangos frescos: R$ 15,00
- Ingredientes do brigadeiro (leite condensado, leite em pó, manteiga): R$ 7,00
- Calda de açúcar e vinagre: R$ 1,50
- Palitos e embalagens decorativas: R$ 8,00
- Energia, gás e extras: R$ 2,00
Totalizando R$ 33,50, ou R$ 3,35 por unidade. Dependendo de decorações mais elaboradas ou recheios especiais, o custo pode subir para até R$ 5,00 por morango do amor.
Com o preço médio de venda entre R$ 15 e R$ 25 em grandes cidades, a margem de lucro por unidade varia de 350% a mais de 650%
🔗 Fonte: Blog Ton – “Morango do amor: como ganhar dinheiro com a trend”
Parte desse sucesso se explica pelo fator estético. O visual atraente e chamativo faz do doce um item naturalmente fotogênico: “instagramável” por excelência.
Em outras palavras, design de sobremesa como marketing gratuito – um palito com fruta capaz de gerar desejo instantâneo só de aparecer em um vídeo viral.
Quando a fila vira gatilho de escassez
Nas últimas semanas, o morango do amor dominou as redes sociais no Brasil. No TikTok, a hashtag #morangodoamor tornou-se uma das 3 mais buscadas da semana, com mais de 16 mil posts em 30 dias (14 mil só na última semana).
No Google, as buscas pelo termo dispararam mais de 100%, com gente procurando “morango do amor perto de mim” em meados de julho.
Vídeos de pessoas provando a novidade acumulam milhões de visualizações – a confeiteira Milena Moreira, por exemplo, já teve clipes com mais de 1,5 milhão de views, exibindo as filas gigantes na porta de sua loja.
Ou seja, a internet pegou um doce ordinário e o transformou em objeto de desejo obrigatório, da noite para o dia.
O efeito manada, claro, não tardou.
Formaram-se filas extensas nas portas de confeitarias pelo país. Em Juiz de Fora (MG), clientes esperam até 40 minutos na fila para conseguir a iguaria; em redes tradicionais de São Paulo, como a Amor aos Pedaços, de repente há gente amontoada nas lojas atrás da novidade.
Esse inusitado fomo açucarado chega a beirar o cômico. Teve cliente oferecendo R$ 50 apenas para furar a fila e garantir seu doce imediatamente.
Psicologicamente, a lógica parece ser “se há tanta gente esperando, deve valer a pena”. A fila vira vitrine e gatilho de escassez – ver a galera disputando um lugar ao sol (literalmente) só aumenta a curiosidade de quem passa.
Nas redes, a promoção ficou em alta sem nenhum investimento formal em marketing. Influenciadores digitais e até celebridades famosas experimentaram e elogiaram o doce espontaneamente, gerando divulgação orgânica massiva.
Um confeiteiro descreveu bem esse ciclo autoalimentado: “A galera compra, grava, posta e aí viraliza mais ainda. É um ciclo muito doido”.
Ou seja, cada comprador vira um garoto-propaganda involuntário, postando fotos da guloseima reluzente e atiçando ainda mais a procura – tudo de graça. Enquanto isso, quem não conseguiu comprar no primeiro lote entra em desespero. Houve caso de cliente brigando com a doceria por ter ficado sem na estreia.
O comportamento de manada está escancarado e, ironicamente, comestível. Em 2025, não basta seguir tendência de investimento ou meme de internet – tem gente seguindo até tendência de açúcar, provando que a irracionalidade coletiva encontra novos sabores a cada dia.
Quando o seu carrinho lucra mais que muita startup
Se tem alguém rindo à toa (talvez a caminho do banco) com essa moda, é o microempreendedor esperto que surfou no hype.
Em questão de dias, dezenas de confeiteiros e vendedores de rua adaptaram seus cardápios para adicionar o morango do amor e colher os frutos (perdoe o trocadilho) financeiros.
Muitos tiveram que se virar nos 30 para dar conta. Em Juiz de Fora, a pequena loja Delícias da Vovó começou a testar a receita no final de junho e, após alguns erros iniciais na calda, engrenou as vendas em 1º de julho; agora comercializa 300 a 400 unidades por dia e lida com fila constante na porta.
“A gente tenta dar conta, mas o movimento não para”, diz Digo Thomaz, dono da doceria que precisou comprar panelas novas (inclusive uma que mexe o creme automaticamente) e aumentar em 70% a compra de ingredientes para acompanhar a demanda.
No quesito branding, a simplicidade do nome “morango do amor” foi um achado. A expressão evoca imediatamente a nostalgia da maçã do amor das festas juninas, conectando o público a uma memória afetiva – porém com uma novidade embutida (afinal, morangos costumam ser mais queridos que maçãs por muita gente).
Alguns empreendedores ainda expandiram a marca “do amor” para outras criações sazonais: a pioneira Priscilla Diniz, da Bahia, depois do sucesso do morango, lançou o “Ovo de Páscoa do Amor” na Páscoa e o “Buquê do Amor” no Dia dos Namorados.
O produto viral virou uma linha temática; tudo que leva a casquinha vermelha pode ganhar o sufixo “do amor” e pegar carona na tendência. É branding de ocasião em estado puro – hoje pode parecer brega, mas no calor do hype funciona que é uma beleza.
Empreendedores de olho na oportunidade também monetizaram o conhecimento. Afinal, em toda corrida do ouro há quem fique rico vendendo pás. No TikTok e Instagram proliferam “dicas de como fazer e vender morango do amor”. O confeiteiro Leonardo Flakes, por exemplo, lançou um e-book a R$ 40 ensinando o passo a passo da receita para aspirantes a doceiros lucrativos.
Influenciadoras como Geicy Galindo dizem ter vendido 120 unidades em 20 minutos de delivery e depois 300 doces em uma hora, e agora comercializam cursos ensinando o segredo desse “sucesso repentino”. É quase um multi-nível do açúcar: vende-se o morango, e vende-se também a expertise de vender o morango, tudo em tempo real durante o auge da moda.
Mas é claro, todo hype acende também um sinal de alerta
Sabe aquela hora de sair antes do pirulito acabar? Alguns profissionais já preveem que essa febre vai derreter tão rápido quanto surgiu. “É uma febre, como a da paleta mexicana, do pistache. Uma hora acaba, as pessoas enjoam”, avalia Carlos Honorato, professor de negócios da FIA.
Quem entrou na hora certa está fazendo a festa, mas ninguém quer ser o último segurando o estoque de morangos quando o público migrar para a próxima tendência.
O empreendedor raiz do morango do amor precisa ter a mesma agilidade para sair de cena no pico do sucesso quanto teve para entrar – antes que o palito doce vire abóbora, ou pior, encalhe no freezer.
🧠 Lições de mercado que a Faria Lima não vai admitir
Identificar tendências e agir rápido vale ouro. Em 2025, venceram aqueles que souberam ler o momento e executar sem demora. Muitos confeitários viram as postagens bombando e em questão de dias já estavam vendendo morangos do amor na calçada.
Quem foi ágil transformou um período de vendas fracas em boom de receita. A simplicidade da operação (uma fruta no palito) permitiu uma resposta rápida – enquanto concorrentes mais lentos ficaram a ver navios (ou a ver morangos acabarem). Não é preciso alta tecnologia quando se acerta em cheio uma demanda emergente.
Além disso, o sucesso do morango do amor prova que ganha o coração do cliente quem apela para emoções e gostos nostálgicos, não necessariamente quem tem o produto mais “inovador” no papel.
Muita gente que nem gosta de maçã do amor entrou na fila pelo morango, movida pela curiosidade e pelo encantamento visual. Ou seja, a decisão de compra foi muito mais visceral do que racional – era sobre fazer parte do hype, sentir aquela experiência doce que “todo mundo” estava tendo. Em mercados saturados de tecnologia complicada, às vezes um toque de afetividade vale mais que mil especificações técnicas.
Em termos de marketing, o morango do amor ensina que embalagem, narrativa e contexto vendem mais que a novidade em si. O doce não é revolucionário – é praticamente um spin-off da velha maçã do amor, que já existia há décadas nas festas juninas. A diferença foi o rebranding para a era do Instagram: uma estética nova (a camada de brigadeiro branco, a calda extra brilhante) e um timing cultural perfeito (inverno, festa julina, redes sociais em alta). Isso gerou viralização espontânea, memes, conteúdo gratuitos.
Fica claro que um bom storytelling e um visual atraente podem turbinar até um produto trivial.
Talvez a lição mais incômoda (sobretudo para quem desfila de terno na Faria Lima) seja que nem toda inovação vem de algoritmos ou pitches elaborados. Às vezes, uma solução simplória e oportunista dá um baile em startups badaladas.
Enquanto muita fintech e foodtech queima dinheiro tentando “reinventar” o consumo, uns vendedores de rua geraram lucro imediato com um produto de apelo universal.
O morango do amor teve produto/mercado fit instantâneo, pagando suas contas desde o primeiro dia – coisa que muito pitch deck prometido no Vale do Silício não consegue em anos.
É a ironia suprema. Um doce de R$ 20 ensina na prática fundamentos de oferta e demanda que MBAs e fundos de venture capital às vezes esquecem. No final das contas, junho e julho 2025 deixam claro que o próximo unicórnio pode muito bem ser um carrinho de doces vermelhos, e que saber ler as vontades do público (por mais efêmeras ou “bobas” que pareçam) é uma habilidade de negócio valiosíssima.
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